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Terra de luta, Terra esquecida, Terra de História

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Situada em Gondomar, a Freguesia de São Pedro da Cova é uma das freguesias que possui um património histórico insubstituível, as Minas de São Pedro da Cova. Foi no final do século XVIII, em 1793, que, segundo o historiador Mazola- Serafim Gesta-, foi a primeira vez que o povo da região teve contacto com esta pedra, o Carvão. De aspeto brilhante, esta matéria prima possui 90% de Carbono, o que significa que o poder calorifico (quantidade de energia libertada por unidade de massa na oxidação de um combustível) que libertava era mais acentuado do que outras pedras de Carvão.

Mazola aponta o ano 1802, como o início da exploração das minas. Na quinta de Valinhas em Vila Verde, o caseiro da quinta, ao abrir umas covas mais fundas com o alvião (Ferramenta de trabalho semelhante a um machado), deparou-se com uma pedra de Carvão. O mesmo, deslumbrado, leva a notícia ao senhorio da quinta. Perplexo com a situação, o senhorio comunica o sucedido ao José de Souza, que continha experiência nas minas de Buarcos em Foz de Sousa. De imediato solicita uma licença de exploração e venda ao governo e o pedido é aprovado e dá-se o início da saga dos mineiros de São Pedro da Cova.

O historiador Mazola refere que, na época, foi solicitado ao campo, mão de obra barata mais os carreteiros que tinham carros de bois disponíveis para realizar o transporte do material. “Antes das minas, estas terras eram de cultivo, passava-se muita fome e o ordenado era irregular”. Hoje tínhamos, mas o amanhã era uma incógnita. Assim, era a vida de muitas famílias na época. Com a descoberta desta matéria, muitos descartaram a agricultura e presenciou-se uma industrialização mineira na região. 

Perto de 1805, segundo Mazola, o estado começa a explorar o Carvão e cessou a concessão. Na época, os responsáveis mandaram vir para Portugal técnicos alemães, que transformaram a exploração rudimentar numa mais modernizada.

A palavra difundiu-se e, rapidamente, assistiu-se a uma imigração de pessoas provenientes de outros locais do país. Apelidados de “Malteses”, vinham à procura de um futuro melhor e mais promissor nestas terras. “Quem estava longe, num período como este, muito difícil no nosso país que no qual a maioria da população trabalhava na agricultura, sem salários, muitas delas até trabalhavam em troca de um caldo, com trabalhos sazonais e quando ouviam que em S. Pedro da Cova existia trabalho e que ganhavam salário e até tinham acesso a casa e a saúde, as pessoas deitavam tudo para trás das costas, maioritariamente os homens e vinham” refere a responsável pelo museu das Minas de São Pedro da Cova, Micaela Santos.

Quando uma pessoa era admitida para trabalhar nos campos mineiros, era concedida uma chapa com um número de identificação que a representava e, posteriormente, os colegas atribuíam apelidos, assim funcionava o processo de identificação da época nos campos de trabalho. 

O mineiro com a pica desmonta o carvão, o seu ajudante apanha com uma pá e colocava nos pirus (carrinho de mão). A exploração era realizada sem luz e o único auxílio dos mineiros era o gasómetro que funcionava a carboneto. As galerias de circulação, continham troncos de madeira colocados na parte de cima dos túneis que serviam para evitar o desabamento de terras e no chão uma linha de carris, onde empurravam as berlindas pelos canais inclinados. Como estes podiam atingir um peso de 700 kg, muitas vezes, “engatavam umas às outras” e recorriam à força dos cavalos para realizar o transporte “até à boca da galeria”. Posteriormente, no exterior, a berlinda entrava numa “jaula” para ser transportada para a superfície, depois eram colocadas nos aparelhos chamados viradores que, ao virar, descarregava todo o carvão sobre os Crivos. “Fazia-se a separação por tamanho, para depois o carvão seguir para os tapetes rolantes, onde entra pela primeira vez a mão de obra feminina” esclarece Micaela, constatando ainda que, legalmente, no interior apenas os homens com mais de 16 anos é que trabalhavam, enquanto que, no exterior, além dos homens, encontrávamos também mulheres e crianças - a partir dos 8 anos (após 1920), no entanto, segundo Mazola, “antes de 1920, pela ânsia de mão de obra barata, traziam crianças com 5 e 6 anos para serviços no exterior com horários desumanos”.

Nas minas, um dos papéis que a mulher desempenhava era o de separação do carvão por qualidade. Esta diferenciação era realizada através do brilho da pedra que quanto mais brilhante fosse, mais qualidade possuía. Após a seleção, as britadeiras -papel desempenhado por mulheres- tinham que reduzir o tamanho do Carvão. Assim, com o auxílio de um “martelinho” nas mãos e uns óculos de rede nos olhos, que serviam como proteção para as lascas que eram projetadas, partiam a pedra para depois ser realizado o processo de lavagem que retirava o pó, em simultâneo, este “banho” ajudava na diferenciação das pedras, segundo Micaela “a pedra que continha mais quantidade de Carvão é mais leve, então consegue facilmente flutuar sobre os jatos de água e aquelas que não tinham tanto carvão, acabavam por afundar”. Após todo o tratamento, o carvão era transportado dentro das vagonas que eram empurradas pelas Vagoneiras até aos silos- local onde o carvão ficava armazenado e aguardava pelo envio para os locais de consumo. 

É no museu das Minas de São Pedro que conseguimos observar a realidade destes homens, mulheres e crianças que de tudo faziam para sobreviver. Constatamos que, desprotegidos de qualquer eventualidade fatal, a exploração nas galerias era feita à base de força dos braços. O trabalho era muito duro e os homens tinham que trabalhar em tronco nu e possuíam apenas uns “calções estilo tanga”.

Em 1807, soam fortes os sinos da freguesia, regista-se o primeiro acidente mortal vindo da lavoura, a causa da morte foi um aluimento de terras nas galerias. António Silva é a primeira vítima mortal registada nas minas de São Pedro, proveniente de outra localidade do país, não viveu o suficiente para um dia encontrar, algures nas minas “a moderna Árvore das patacas”.  

Em 1895, acontece o maior acidente mortal das minas - no Passal de Baixo - 8 mineiros perdem a vida.

Em 1909, é constituída uma empresa, a Companhia das Minas de Carvão, que tinha técnicos “quer para os avanços dos trabalhos subterrâneos, quer para acompanhar o desenvolvimento do exterior”, constata Micaela. Mais tarde, em 1914/1916, os responsáveis sentem a necessidade de criar um meio de transporte mais rápido para a Cidade do Porto. Propostas são apresentadas e cria-se o teleférico, mais conhecido pelos populares como cestas. O cabo aéreo passava pela estação de comboios de Rio Tinto, onde procedia o descarregamento do carvão para ser transportado nos Caminhos de Ferro para outros pontos do país, enquanto que as outras cestas continuavam em direção às Antas para se distribuir pela cidade do Porto. Posteriormente, a companhia de Carris do Porto, atual CP, constrói uma central em Massarelos e começa a consumir 100% de carvão, proveniente das minas de S. Pedro, com o intuito de produzir energia para os seus elétricos. Assim, os responsáveis sentem a necessidade de construir uma linha de carris para que as zorras (Elétricos que faziam transporte de mercadorias) pudessem circular. Como a empresa vinha diretamente a São Pedro da Cova buscar o carvão, eles usufruíam de um desconto por cada tonelada de carvão transportada.

Em 1860, as minas de Monte Alto passam a ser concorrentes das Minas de São Pedro da Cova até sensivelmente 1900, após esta data, sob gerência Silvas e Rocha, dá-se a ligação de ambas as minas e passa a haver apenas uma- As minas de São Pedro da Cova.

Em 1920, as minas entram num novo ciclo e presenciam-se grandes melhoramentos nos campos mineiros. A 4 de dezembro é inaugurado o primeiro bairro operário, a primeira cantina, a primeira escola e a primeira farmácia. Até então, as habitações dos operários eram em barracos de madeira. É nesta altura (1921-22) que o símbolo da história das minas de São Pedro da Cova é construído em madeira, conhecido como Cavalete, a sua função era a de retirar o carvão, mais tarde, a 1 de janeiro de 1937, o cavalete é reconstruído em cimento armado (sistema estrutural da construção civil que se tornou um dos mais importantes do século XX)- esta estrutura ainda se encontra no local. Com a modernização os cavalos passam a trabalhar no exterior e no interior o transporte passa a ser realizado por tratores a diesel. 

As minas de São Pedro da Cova passaram também pelo período do poder estrito do Estado Novo. Durante a Primeira Guerra Mundial, quando Portugal se declara do lado dos Aliados, o comércio internacional é fechado para o país e as Minas tornam-se essenciais para o funcionamento da nação. Em vez de irem para a guerra, muitos homens são recrutados para trabalhar nos campos mineiros em condições desumanas.

As minas de São Pedro da Cova encerram definitivamente em 1972, embora que até 1998, a companhia das minas ainda estava ativa, mesmo sem exploração mineira. 

Ao ser questionado pelo estado de degradação do património, ao VivaCidade, o presidente da União de freguesias de Fânzeres e São Pedro da Cova referiu que “a Junta de Freguesia já, há muitos anos, que vem chamando a atenção pelo estado de degradação que tem aquele património e é nessa medida que temos insistido junto das entidades competentes a devida requalificação daquele lugar, que agora, aparentemente, é da  Câmara Municipal”, o presidente acrescenta ainda que “há um projeto já com mais de 20 anos, sugerido, pela Faculdade de Engenharia do Porto (…) que está muito atual e que pode muito bem ser aproveitado para a requalificação daquele espaço”, Pedro Vieira apela para que o executivo da câmara inclua a junta de freguesia em qualquer decisão que eventualmente possa ser tomada, pelo facto destes deterem mais conhecimento sobre o património. ■

António Aguiar- Galo

António Aguiar, apelidado nas minas por Galo, tem 94 anos e começou a trabalhar nas minas com 14 anos. Com tenra idade começou por “acartar” lodo na cabeça e aos 16 anos foi recrutado para trabalhar nas galerias. De mineiro passou para encarregado das galerias e a sua responsabilidade consistia em controlar o que os mineiros realizavam, admitindo que muitas vezes ajudava as pessoas para não serem penalizadas. Participou na equipa de futebol dos mineiros, sendo este “uma das suas maiores paixões”. Enquanto realizava a entrevista, o mineiro com o olhar sobre o cavalete confessa “que é uma pena o estado que as minas se encontram”.

Erminda Nogueira- Tabuja

Erminda Nogueira, apelidada por Tabuja, impressiona pela sua vivida memória, filha de pai e mãe mineiros recorda-se, orgulhosamente dos números de placa de todos, inclusive do seu marido. O seu percurso nas minas começou aos 14 anos e foi encaminhada para o trabalho na lama, onde depois do carvão ser lavado, levavam à cabeça para colocar a secar ou deitar nas vagonas. A mineira confessa que muitas vezes reduziam o peso que colocavam nos cestos porque não aguentavam, mas as encarregadas quando notavam o sucedido chamavam logo a atenção e colocavam mais. Aos 16 anos, passou a trabalhar no terreiro a partir pedra. Erminda confessa que o trabalho era feito de joelhos no chão e apenas tinham os óculos para proteger das lascas, muitas vezes, cansadas, as mulheres paravam, mas logo de seguida uma superior aparecia e “calcava as mãos das trabalhadoras contra o chão”, obrigando-as a continuar o trabalho. A mineira revela que na época que trabalhava nas minas conheceu o seu marido, José Resende, apelidado por Pepé, agora falecido, trabalhou nas galerias muitos anos. “Ele trabalhava no fundo e eu cá fora. Ele foi para a mina com 11 anos, andava com os cavalos e depois foi para o fundo da mina”, a mineira continua referindo que uma vez ficou preocupada porque houve uma morte nas galerias e o alvoroço instalou-se no exterior “não sabíamos quem tinha sido e todos diziam que o meu homem tinha morrido (…) Eu estava casada à 15 dias”, Erminda não queria acreditar que tinha sido José a morrer. “Felizmente para mim” quem morreu foi outro mineiro, a mineira explica que quando existia alguma morte os responsáveis arranjavam sempre uma forma de enganar os trabalhadores para não causar nenhuma desordem. Na altura de Salazar, recorda que tinham que estar “caladinhos e de bico fechado” para não serem presos ou castigados como muitos foram. Mesmo grávida trabalhou até à última hora e recorda que a altura das minas era dura e que sente pena de ver o estado em que as instalações mineiras se encontram.

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