Presente na cidade de Peso da Régua para as comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, deu uma entrevista em exclusivo ao Grupo VivaCidade onde abordou algumas polémicas da política nacional.
Estamos a comemorar mais um 10 de junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades: porquê a escolha de Peso da Régua para as celebrações deste ano?
Eu tentei explicar isso no meu discurso. Este 10 de junho é muito inovador e uma das razões para tal é porque, pela primeira vez, não houve uma Cidade Europeia do Vinho, mas 19 municípios que ao mesmo tempo foram escolhidos para receber essa distinção. Algo único. Antes nunca houve, assim como nunca houve um 10 de junho celebrado, simultaneamente, não só numa cidade, mas em toda uma região como no Douro.
Nunca antes tinha havido a escolha de uma região com uma homogeneidade como esta, em que é o vinho que introduz coesão neste território.
Este é um território coeso. Há desigualdades, certamente, mas há mais semelhanças do que diferenças. Essas semelhanças são a interioridade profunda muito ligada à agricultura, que depois teve componentes que surgiram como o turismo ou o aprofundamento da cultura. Tem uma raiz histórica única que se materializa na expressão do vinho. Isto é muito novo na Europa e em Portugal, é uma rutura. É difícil voltar ao estilo antigo, mas também não será fácil evitar regressar à realização destes eventos nas capitais de distrito, de uma forma rotativa.
Isto foi tão estranhamente novo que os portugueses ficaram um pouco surpreendidos. Depois de escolhida a região era preciso escolher um local para ser o centro destas celebrações. É certo que houve atividades espalhadas pelos diferentes municípios, mas escolheu-se o Peso da Régua e percebe-se porquê. Esta é a região da Dona Antónia Ferreirinha que, no seu tempo, unificou o que era possível unificar. O vinho, hoje, também significa essa união.
Isto chamou igualmente à atenção dos estrangeiros que há muito tempo têm o apelo do Douro, de muito português que, certamente, não sendo de cá vai passar a vir cá explorar o que não conhecia. Permitindo à região dar mais passos em frente.
Considera que a cerimónia ficou manchada quer pelas vaias ao ministro João Galamba, quer pelos protestos dos professores?
Note bem o seguinte: todos os 10 de junho, bem como no 5 de outubro ou no 25 de abril, houve protestos, fossem da educação, da saúde ou de outros setores. A democracia é isso, é aqueles que por razões que consideram de luta justa, aproveitarem momentos de antena e de encontro para, em primeiro, encontrarem aqueles que consideram ser os alvos dos seus protestos e, em segundo, para levarem a mais gente aquilo que são as suas reivindicações.
Isso aplica-se às popularidades ou impopularidades de cada momento, portanto, é a história da democracia, é a história do confronto de opiniões.
Há uma unidade no essencial, que deve haver, e apelei a essa unidade, mas depois o pluralismo e a diversidade são próprios da democracia, senão era uma ditadura.
Em virtude dos vários casos que assolaram este governo, esteve presente alguma vez na sua cabeça a dissolução da Assembleia da República?
Não. Naquele instante e até hoje nunca me passou pela cabeça. Tinha ponderado os prós e os contras e tinha considerado que o preço era demasiado elevado para aquilo que pudesse justificar uma decisão dessas.
O prato da balança do dever era mais pesado do que o do haver, portanto tal nunca me passou pela cabeça.
Para o país, a decisão que tomou era a melhor?
Para o país esta era a melhor solução: chamar à atenção para aquilo que eu considerava que era fundamental em termos de Governo, e o porquê. Mas, ao mesmo tempo, esclarecer que isto não implicava deitar o jogo abaixo com eleições para a Assembleia da República.
É evidente que, tendo havido uma divergência de visões, pela primeira vez, sobre uma matéria de fundo no julgamento de uma situação política, implica para o futuro uma maior atenção, um maior acompanhamento já de alguma maneira suposto existindo uma maioria absoluta.
Uma maioria absoluta supõe uma responsabilidade absoluta e um maior controlo do Presidente da República.
Tem dito muitas vezes que é um Presidente vigilante: é assim que se vai manter?
Não só vou continuar como vou intensificar se for necessário.
Está sensivelmente a meio do seu último mandato. Considerava-se um homem feliz se no final tivesse quais problemas resolvidos?
Gostaria de ter resolvidos meia dúzia de problemas que não dependendo da minha ação tenho feito força para que se resolvam.
Quanto à saúde, a transição de um modelo que estava a precisar de reforma para um novo modelo de gestão do SNS. Está em curso, o caminho é por aí mas tem que ser rápido.
Depois na educação, ir um pouco mais longe no ensino superior proporcionando a todas as instituições aquilo que algumas têm conseguido afirmar com alguma facilidade, não deixando para trás as que possam ter mais dificuldades sobretudo financeiras.
No ensino em geral há vários problemas a resolver que espero ver resolvidos, a transição geracional dos professores, a avaliação do esquema de organização que existe e o conseguirmos acompanhar permanentemente os avanços que há lá fora.
Nas infraestruturas gostava que houvesse uma decisão sobre o aeroporto de Lisboa e sobre a TAP, que houvesse o avanço da ferrovia e que a habitação conhecesse avanços, no terreno, iminentemente visíveis para começar a resolver os problemas mais prementes que se colocam.
Além disto, que já é muita coisa, gostava que a democracia fosse uma democracia forte. Isto significa que os protagonistas políticos, económicos e sociais estivessem renovados. Em alguns casos essa renovação é mesmo necessária. Que a comunicação social fosse mais forte, não tivesse os problemas económicos e financeiros que a podem fragilizar, e que houvesse uma proximidade maior entre governados e governantes.
Parece-lhe possível isso?
Tem que ser, os próprios têm que fazer pela vida. Se não fazem pela vida há vazios e os vazios em política são sempre preenchidos por alguém. Gostaria que o sistema político português fosse um sistema forte em 2026.
Que mensagem gostaria de deixar aos nossos leitores?
Uma mensagem muito simples: leiam esta imprensa porque ela tem de viver, não basta apenas a história que tem atrás de si.
É fundamental, cá dentro, pela tal proximidade entre as pessoas e aqueles que dão voz às sua reivindicações; e, lá fora, nas nossas comunidades, para manterem a ligação às suas raízes.
Há muito tempo que uma das coisas com que me preocupo é tanta dessa imprensa estar a morrer ou estar em crise. E isso só depende de cada um e de cada uma que vive nessa região: ler e participar. Se o não fizerem não há milagres.
Aquilo que são bastiões de defesa deste interior profundo devem ficar mais fortes, depende dos leitores.