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Manel Kape "Eu não preciso de nenhum apoio para dizer que sou Português, ou que sou Angolano, faço isto porque é de mim, é meu e amo Portugal”

Manel Kape é atualmente, um dos únicos portugueses presentes na UFC (Ultimate Fighting Championship). É no peso mosca que se encontra. Veio de Angola, para Gondomar, mas para seguir o seu sonho, desde tenra idade, foi combater para os ringues internacionais. Combates esses que lhe valeram quatro cinturões, sendo um deles o de Campeão Mundial de MMA.

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Fala-me um pouco sobre a tua história, sei que nasceste em Angola. Mas como é que vieste parar a Portugal e principalmente, como é que vieste ter a Rio Tinto?

Quando vim para Portugal tinha exatamente dois anos. O meu pai era pugilista, lutador de boxe e quando ele foi lutar para Portugal, enquanto amador, o Boavista FC gostou muito dele, porque ganhou todos os torneios. Chegou a ser convidado para participar nos Jogos Olímpicos. Como o clube gostou muito dele, arranjou-lhe trabalho e casa. Foi nesse exato momento que o meu pai aproveitou a oportunidade e, juntamente com a minha mãe e os meus irmãos, -na altura éramos quatro, agora somos cinco- trouxe-me para Portugal.

Inicialmente, fomos viver para Gaia, onde estudei, mas estivemos pouco tempo a viver na cidade, cerca de um ano...

Depois, foste viver para Gondomar, mais precisamente Rio Tinto?

Sim. Como o meu pai era atleta do Boavista, ele conquistou muita coisa no desporto, principalmente para a equipa que representava. Foi através do Valentim Loureiro que ele tomou conhecimento de uma casa em Rio Tinto e mudamo-nos para lá.

Dirias então que esta paixão que desenvolveste pelo MMA, surge um pouco, pelo teu pai ou foi uma vontade própria?

O mundo da luta está no nosso sangue, a minha paixão, paixão, era o futebol. Joguei futebol, cheguei a jogar no Rio Tinto, cheguei a jogar por várias equipas e posso dizer que tinha mais talento para o futebol, do que para a luta...

Isso já não sei se concordo, porque para chegar à UFC não é qualquer atleta...

(Risos) Não, não... eu também acho que podia ter chegado mais longe no futebol, porque tinha talento para isso. Juntamente com o futebol, também praticava Boxe, mais tarde comecei a fazer Jiu-jitsu.

Mas porque é que decidiste mudar do futebol, para a luta?

Por causa da competitividade. Quando era mais novo, como se diz em bom português, era um “bocadinho armado” (risos) e as vezes faltava aos treinos de futebol, porque pensava que já não precisava de treinar e só ia aos jogos, mas já tinha perdido um pouco essa competitividade....

Já não o cativava?

Não, eu gostava, mas sentia que não havia competitividade e quando fui treinar Jiu-jitsu, com o Kleber, que foi o meu primeiro mestre, em Matosinhos, achei a modalidade interessante. Achei que me dava competitividade. Direi mesmo que me fascinou. Dava-me outra adrenalina. E o desporto de combate já me estava no sangue e até já fazia o Boxe, mas só a pratica de poder mobilizar as pessoas e elas não conseguirem fazer nada... excitava-me. Era outra sensação.

Antes de focarmos na tua carreira profissional, para as pessoas perceberem, um atleta da UFC, não se restringe só a uma modalidade de luta... qual é que dirias que é a tua especialidade e quais as outras arte marciais que dominas?

Posso dizer que sou um atleta muito completo, porque faço Boxe desde tenra idade, e comecei também muito cedo com o Jiu-jitsu. Então, na luta agarrada, ambas são as minhas especialidades, mas claro, eu tive que treinar muito Karaté, treinei no Japão, fiz Muay thai, onde estive três anos a lutar na Tailândia, fiz Wrestling, onde treinei em Angola durante um ano com um amigo, que era Campeão da Modalidade e depois, comecei a treinar este estilo de luta com os russos, porque eles são especialistas nesta arte marcial. Então, posso dizer que eu faço um pouco de tudo. Estas são as minhas faculdades. Acho que consegui, não vou dizer que consegui fazer um “mestrado” em tudo, mas tenho conhecimento nessas várias modalidades. Mas claro que o Jiu-jitsu, Boxe e o KickBox são, os meus “Mestrados”, onde sou muito forte...

Como é que um atleta português, consegue chegar à UFC, sendo que é um dos maiores, se não o maior campeonato do mundo de luta? Dado que não é habitual, o percurso é fácil? Vocês sentem o apoio das entidades?

Eu e o André Fialho (que acabou de assinar contrato) somos os únicos neste momento... Claro que a trajetória não é fácil, porque temos que abdicar de muita coisa, e quando tomamos a decisão de escolher o desporto de combate, temos que renunciar a várias coisas, e como sabemos, em Portugal, o desporto de luta não é cultural, porque o desporto rei é o Futebol -só se houve falar dele-, o resto é praticamente esquecido. No início, conseguir apoios é difícil, mas na minha visão e pela minha própria experiência, muitos atletas dizem “Ah, em Portugal é difícil”... Claro que é difícil para todos... “Ah, porque não temos apoios”... mas na minha opinião, “tu” é que tens que ser o teu principal apoio. Ninguém te vai patrocinar de início, porque ninguém sabe quem tu és e só estás a começar agora, então, sinto que as pessoas também se queixam muito, “isso é nosso”, é de Portugal... o dizer que “não há apoios”, é porque muitas vezes tu próprio não te apoias na tua própria carreira, porque preferes à sexta ou ao sábado, gastar o dinheiro que tens, em ir sair à noite, ou para uma discoteca, em vez de comprares o teu próprio material. Isso também é um apoio, é um auto-investimento e posso dizer que, tive muito cedo essa perceção na minha vida... Percebi que deveria investir em mim. Sendo que, não é cultural e muitas pessoas não conhecem bem o desporto, agora é que, graças à UFC, já se sabe mais... mas fugindo um pouco à conversa, sempre soube que não seria fácil, e como é óbvio, não dá para conciliar tudo, porque se não tiveres o apoio dos teus pais em casa e se vives só, claro que vai ser mais complicado. Muitas vezes, eu também não segui os caminhos mais corretos, mas tentei sempre focar-me nos meus objetivos e sabia que para evoluir até certo ponto, tinha que sair de Portugal e criar contactos. Foi quando decidi sair e ir treinar para fora... e foi nesse momento que comecei a adquirir outros conhecimentos. Mas o caminho não é fácil, isso é claro.

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Quando saíste de Portugal, tiveste que deixar a tua família e amigos para trás, é fácil seguir este percurso sabendo que tens que deixar aqueles que mais amas?

Costumo dizer que há dois países que conseguiria viver, o Japão e Portugal. Mas Portugal é muito confortável e a qualidade de vida é muito boa! E, por causa disso, foi muito difícil deixá-lo, porque nós nos apegamos à cultura, à comida e às pessoas. Por isso, foi extremamente difícil. Muitas das vezes cheguei a chamar amigos meus, para saírem de Portugal e investir nas suas próprias carreiras, tal e qual como eu fiz, com a única diferença que teriam o meu apoio, ou seja não estariam de início perdidos, como eu estive, porque eu já trilhei esse caminho, mas mesmo assim, eles não conseguiram sair. O estar longe da minha família, dos meus amigos e da rotina que tinha em Portugal, foi muito complicado.

Normalmente, os atletas tem Nicknames (apelidos), por isso questiono-te o porquê de Starboy?

Quando comecei como amador, o meu primeiro nickname era Prodígio. Em Portugal fiz muitas lutas amadoras e competia com lutadores mais velhos. Na altura tinha 17\18 anos e lutava com atletas de 29\30 anos e era uma disparidade de idades muito considerável. Mas, conseguia igualmente vencer e as lutas eram fáceis, foi por isso que as pessoas começaram a chamar-me de Prodígio. Até ao momento em que assinei com uma promotora no Japão, que na altura era a melhor promotora do mundo, que denominava-se Pride e agora chama-se Rizin, e pela minha forma de ser, pela maneira como me visto e falo, as pessoas começaram a chamar-me de Starboy.

Neste momento, estas no Ranking da UFC, na 14ª posição, isto é importante para um atleta, mas peço-te que expliques às pessoas que não o sabem, o porquê dessa importância.

Já estive na 4ª posição do Ranking, quando fui Campeão do Mundo no Japão... é importante porque esse é um ranking criado pela UFC, que é considerado como um Ranking Mundial, para chegarmos até ao topo, é preciso lutar e escalar. Mas, é muito aleatório, porque tem mais peso quem tu és e o nome que tens. É muito mais considerável ser conhecido como atleta, que vendes, que tens audiência, do que seres Rankiado. Posso dizer que, eu sou um caso à parte, porque se amanhã eu quiser lutar com o nº 3 ou nº 2 do Ranking, eu luto, muitos dos outros atletas não têm essa consideração, tem uma escada ainda por escalar...

Mas isso também passa por aquilo que me estavas a dizer e que passo a sublinhar que é, esse respeito que conseguiste obter foi graças às conquistas que obtiveste ao longo da tua carreira...

Correto. Normalmente, na UFC é mais Bussiness (negócio), é tudo à volta do que fazes e do que geres para a empresa. Por vezes, se não fores um atleta mais notório, claro que não vais ter capacidade para negociar e também não vais poder ter exigências. Então, por vezes vais ter que deixar à empresa a responsabilidade de ela dizer o que tu tens que fazer, e não tu fazeres o que tens na tua própria cabeça ou criares as tuas próprias ideias.

Tu tens algum ídolo?

Tenho. Tenho. É a minha mãe e o meu pai. A minha mãe pelas batalhas que sempre teve e houve uma altura em que estávamos os dois sozinhos em Portugal, porque o meu pai estava fora, e ela era empregada doméstica. Sempre nos manteve na humildade, sempre nos educou de maneira correta e nunca faltou comida na mesa. O que ela me ensinou, ficou e ficará para a minha vida, como ensinamento. Para mim, ela foi a maior guerreira.

Agora faço-te a pergunta ao contrário, gostarias de ser um ídolo para as próximas gerações, principalmente no desporto de combate?

Claro. Acho que já sou, pelas coisas que fiz e pelas coisas que tento fazer pelos outros. Sempre ajudo os outros no Off, porque nunca quis ter méritos do que fazia, tentei sempre ajudar outros atletas, sem qualquer reconhecimento, mas é da minha natureza ajudar porque, desde pequeno, que sempre fui ajudado. Apesar de ter tido muitas dificuldades, sempre tive pessoas que me apoiaram, principalmente em Portugal, tanto a mim, como à minha família. Assim, sempre tive esse meu lado sentimental de ajudar ao próximo. Faz parte da minha natureza.

Normalmente, para as tuas lutas, tens sempre por hábito levar as bandeiras de Angola e de Portugal, isso é uma forma de valorizares e mostrares ao mundo, o orgulho que tens em seres português?

Claro. Eu sempre deixo bem claro para as pessoas que eu não tenho nenhuma ajuda governamental. Eu tenho Angola como consideração, porque é o país onde nasci e valorizo as minhas raízes. Nunca vou deixar de ser angolano porque é o meu sangue, é onde a minha mãe nasceu, o meu avô nasceu e o meu pai nasceu, e apesar de não ter criado laços lá, desde criança, desde que competia como amador, sempre levei a bandeira de Angola para qualquer sítio que fosse. Quanto a Portugal, sinto-me português, porque foi onde recebi a minha educação escolar, foi onde tive a minha educação, foi onde aprendi Artes Marciais, foi onde criei os meus amigos, onde tive as minhas namoradas (risos), tudo, tudo. É a minha base. É o meu suporte. É onde me sinto em casa e é onde me sinto extremamente confortável. E, eu não preciso de nenhum apoio para dizer que sou Português, ou que sou Angolano, faço isto porque é de mim, é meu e amo Portugal.

Com que idade começaste a competir internacionalmente?

Quando estava em Portugal, fazia muitos combates fora do país. Competi em França, Espanha... onde ganhei dois cinturões, um em cada país. Isto ainda treinando em Portugal, mas penso que comecei a sair de Portugal, com cerca de 18 anos.

É nessa linha que te questiono, na tua carreira profissional até ao momento, quais foram as conquistas que mais te orgulharam, aquelas que bates no peito e dizes “eu consegui!”...

Todas as vezes que ganhei um cinturão. Na minha carreira tenho quatro cinturões, graças a deus, e claro que o meu primeiro cinturão foi bom, mas o melhor cinturão, melhor, aquele que me soube melhor -e mesmo se ganhar um cinturão na UFC, não será a mesma sensação-, porque esse cinturão para mim foi como o primeiro amor da minha vida, porque é aquele que nós nunca esquecemos, foi o cinturão que ganhei no RIZIN - World Champion, no Japão, quando sagrei-me Campeão Mundial. Foi uma sensação de realização e de concretização, porque nesse dia consegui ter os meus objetivos realizados, enquanto profissional. Eu sinto-me realizado, porque a partir dai, não precisei de mostrar mais nada para ninguém... é assim, Campeão Nacional, fui campeão mundial, coisa que nem a Seleção Nacional Portuguesa é... então, naquele momento pensei que, se eu morresse hoje, era um homem feliz, porque não precisava de mais nada... não há dinheiro que pague essa sensação.

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Conquistar quatro cinturões, estar na UFC, acredito que tenhas necessidade de uma preparação física diferente, tens muitas restrições?

Tocaste agora num assunto que não gosto de falar (risos). Mas já que é para ser sincero... é assim, sempre exigi muito de mim. Sempre tive uma didática e um modo de treino, principalmente no desporto de combate, em que exigia muito de mim. Sempre fui muito adepto do trabalho. Mas, não vou estar a mentir, o meu forte não é ser muito disciplinado... eu digo para as pessoas fazer aquilo que digo e para não fazerem o que faço. Não sou o melhor exemplo, porque as vezes a disciplina não é o meu forte... não tenho muito orgulho nisso, por vezes, muitas das coisas que conquistei foi mais com o talento e a inteligência que tenho no momento. Claro que sempre treinei, sempre soube que a hora da luta, é a hora da luta e que a hora de treinar, é a hora de treinar. Sempre tentei focar-me, apesar de que para mim, muitas das vezes é difícil. Mas sempre treinei para o meu propósito.

Quando é que pretendes voltar a lutar novamente, tens alguém em mente que gostarias de competir?

Era para competir agora em fevereiro, mas o adversário que ia enfrentar, desistiu da luta... preferiu lutar com outro oponente e agora estamos a estudar para ver se luto em março. Vamos aguardar...

Tens algum sonho de combate que gostarias de ter a possibilidade de fazer?

Não tenho isso.... Acho que essa pergunta é mais para os meus adversários, do que para mim...(risos)

No ano passado, começaste a perder as duas primeiras lutas, mas rapidamente voltaste às vitórias, ao vencer as duas lutas seguintes, sendo que, uma delas foi com Nocaute de joelho, que impressionou os fãs da modalidade... como é que te sentiste com a tua prestação?

Eu entrei na UFC com muito hype, com muita consideração, porque a minha primeira luta foi logo para disputar o cinturão, uma coisa que é, quase impossível. Então, entrei logo com um contrato de que a minha primeira luta seria pelo cinturão. No início, posso dizer que não estava com o foco necessário. Mas foi uma boa lição, porque sabia que era melhor do que eles os dois, apesar da segunda derrota ter sido um roubo total. Mas, por vezes, não é o melhor lutador que vence numa noite.

No teu currículo, a tua prestação é muito boa, por nocautes, não tens nenhuma derrota, tens 11 vitórias. Tens sim, duas derrotas por submissão e quatro por, decisão do Juiz.... Isso é notável...

Esses resultados são os que deixam os adeptos mais atentos, porque considerando a minha classe de peso, há muitos nocautes, mesmo os pesos mais pesados do que eu, que é normalmente onde os atletas têm a mão mais pesada e é onde há mais nocautes, a nível de números, tenho muitos mais, do que a maior parte dos atletas de outros pesos mais pesados. Isso é considerável, porque é uma exceção, principalmente numa categoria de peso mais leve.

Hoje, olhando para trás, para a tua carreira, sentes-te realizado?

Sim, sinto-me muito realizado. Antigamente era mais amor à camisola. Via com outros olhos, hoje em dia não. Hoje, faço as coisas mais pelo dinheiro, pelos meus objetivos que pretendo ter e por realizar os meus outros objetivos profissionais, porque o mundo da luta abriu-me as portas para outros negócios. Porque falando abertamente, em termos profissionais, como atleta, já me sinto realizado, é mais para abrir as minhas portas.

Qual é, neste momento, a tua maior ambição/sonho?

Ter um “mega” restaurante. Um restaurante diferenciado.

E tens alguma mensagem, ou conselho, que gostarias de deixar às pessoas que como tu, querem vingar nesta área do desporto?

Que estejam focadas. Se estão a trabalhar desde cedo e de início, sejam eles os próprios investidores da carreira e que sejam persistentes, porque é a persistência que te leva ao sucesso. ■

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