Em 1993, João Santos, iniciava a carreira como árbitro assistente no campo do Valadares Gaia FC. O que começou por ser um hobby tornou-se uma profissão que levou o portuense a viajar pelo mundo e a ser considerado o melhor árbitro assistente da Liga Portuguesa, em 2007. Ao Vivacidade, relembra os 21 anos de carreira e sublinha a qualidade dos árbitros portugueses.
Acabou a carreira no dia 18 de maio. Quando é que decidiu enveredar pela arbitragem? Foi há 21 anos. Sempre adorei o desporto e fui jogador das camadas jovens do Rio Ave, mas como não tinha jeito optei por tirar o curso de árbitro. Três meses depois acabei por chegar à 1.ª divisão.
Ser árbitro era hobby ou profissão? Hobby na fase inicial, mas rapidamente tornou-se profissão.
Quantos treinos tinha por semana? Tinha quatro treinos por semana. Às terças e quintas treinava no Centro de Treinos do Porto e depois tinha o treino de segunda-feira. Além disso treinava sempre antes do dia do jogo.
Quantos jogos arbitrou durante a carreira? Fiz mais de 1500 partidas, 242 jogos da 1.ª Divisão, a nível internacional somei 23 jogos da Liga dos Campeões e mais de 100 jogos Internacionais.
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Em 2007, foi eleito o melhor árbitro assistente do país. Foi o melhor momento da carreira? Não, porque o que mais gosto de fazer é arbitrar jogos de formação. Em 20 anos de 1.ª Divisão nunca deixei de ir aos jogos das camadas jovens.
Por ser a versão mais “pura” do futebol? Não diria tanto porque os miúdos também querem ganhar, mas nas camadas jovens procuro ajudar a formar atletas e transmitir-lhes algumas ideias porque são jovens em crescimento.
Porque falhou o Mundial de 2010, na África do Sul? Falhei por muito pouco. Cheguei a trabalhar no projeto com o Olegário Benquerença, o Bertino Miranda e o Paulo Januário, mas alguém tinha de ficar de fora e fui eu.
O choque com John Ogu, da UD Leiria, em 2012, é um momento para esquecer? O lance foi casual, não houve qualquer tipo de maldade, mas desde o momento do choque não me recordo de mais nada. O jogador era forte e eu bati com a cabeça no peito dele. Foram necessárias duas semanas para recuperar a 100% do traumatismo, mas fiquei sensibilizado com o apoio prestado.
No fim do jogo, o treinador Manuel Cajuda admitiu que estava mais preocupado consigo do que com o resultado final (UD Leiria 0 - 0 SC Beira-Mar). Como se sentiu quando viu estas declarações? A relação que tenho com o mister Cajuda é de cordialidade. Ele fez essa afirmação e teve o cuidado de me contactar diariamente durante uma semana. Isso mostra as amizades que existem dentro e fora do campo.
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Curiosamente começou e terminou a carreira no Complexo Desportivo do Valadares. Foi planeado? Não comecei onde quis mas acabei onde quis [risos]. Tive orgulho em terminar a carreira no campo do Valadares Gaia FC num jogo das camadas jovens porque foi onde tudo começou.
É difícil ser árbitro em Portugal? Muito difícil. Um jovem que consiga aguentar dois anos de divisão distrital a aturar um certo tipo de comentários e insultos, poderá vir a ser um bom árbitro profissional. Por vezes não estamos conscientes do que estamos a fazer e não é cativante ser insultado da forma como somos.
Nunca ficou desiludido com o futebol português? Não, continuo a adorar o futebol e a arbitragem. Sinto-me fortalecido por atritos ou quezílias que possam ter existido.
Qual foi o caso mais polémico em que esteve envolvido? Recordo-me de uma situação num UD Leiria – Sporting CP, em 2007, em que expulsei o Liedson aos 21 minutos e quiseram criar um caso. Como os árbitros não se defendem na televisão e não vendem jornais, é sempre fácil alimentar essas polémicas.
A introdução das novas tecnologias no futebol é a grande mudança na arbitragem? É uma das principais. Antigamente, como não haviam imagens de vários ângulos era mais difícil avaliar a decisão de um árbitro. No entanto, não considero que as câmara nos prejudiquem e por muitas críticas que façam a arbitragem portuguesa é muito boa.
É a favor da introdução das novas tecnologias no futebol? Somos a favor de tudo o que contribua para a verdade desportiva mas não nos compete a nós decidir o que é melhor ou pior, essas decisões cabem à FIFA. O futebol nunca vai deixar de ser um jogo com contacto físico, o que por vezes altera muita coisa.
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Concorda com o projeto de profissionalização da arbitragem? Como dirigente da APAF estou totalmente solidário com o projeto. Acho que a arbitragem tem que ser profissional. Não faz sentido um árbitro estar num local de trabalho durante 8h por dia e ter que sair para treinar intensamente, às 18h30. Não há possibilidade de conseguir treinar em condições porque já estamos desgastados de um dia de trabalho. No entanto, penso que seria importante alargar esse projeto aos árbitros assistentes.
Considera que o seu dever para com a arbitragem está cumprido? Não. Este é o fim de uma fase da minha carreira que irá agora passar pela formação. Também sou dirigente da APAF e espero continuar a dignificar a arbitragem em Portugal.