Aos 51 anos, Isabel Santos prepara-se para enfrentar um novo desafio. A deputada socialista integra a lista de candidatos do PS às próximas eleições europeias e poderá tornar-se a primeira gondomarense a ocupar um lugar no Parlamento Europeu. Ao Vivacidade, Isabel Santos explica os motivos que a levaram a dar este passo e reafirma que este é um dos momentos mais decisivos para a continuidade da União Europeia.
A Isabel Santos é a primeira gondomarense a integrar uma lista ao Parlamento Europeu em lugar elegível, de acordo com as últimas sondagens. Tendo em conta esta possibilidade, é justo falarmos numa sensação de orgulho? De facto, penso que serei a primeira gondomarense a integrar uma lista em lugar elegível, mas vamos ver se serei eleita ou não. Contudo, julgo que serei a primeira pessoa de Gondomar a ocupar uma cadeira no Parlamento Europeu.
Acolhi este desafio com naturalidade, tendo em conta o meu percurso na Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), que integra no seu seio todos os países da União Europeia (UE), entre outros países que nunca integrarão a UE. O âmbito é diferente, mas há uma experiência internacional acumulada, por isso encaro este desafio com alguma naturalidade e numa lógica de continuidade do trabalho que tenho desenvolvido.
Foi fácil deixar a Assembleia da República e a OSCE? Nunca fiz grandes planos em termos de percurso político. Fui trilhando o meu caminho, com uma certa coerência, e defendendo princípios com que me identifico. Não tinha motivos para dizer que não a este desafio e era evidente que mais tarde ou mais cedo deixaria o Parlamento para assumir outras tarefas. Decidi responder afirmativamente ao convite que me foi feito pelo secretário-geral do PS.
Que balanço faz deste seu último mandato na Assembleia da República? Nos últimos dois mandatos dediquei muito da minha intervenção à Assembleia Parlamentar da OSCE, porque fui presidente da Comissão de Direitos Humanos durante três anos e fiz um percurso reconhecido, que deixou a sua marca. Contudo, isto custou-me algum sacrifício relativamente à intervenção na política nacional.
Nos últimos anos, fui vice-presidente da Assembleia Parlamentar e garanti muitas vezes a frente da AP em várias missões, que sempre executei com grande dedicação e abnegação.
Ainda tinha outras missões por concluir, mas face a este desafio não poderei terminar essas tarefas. Fico com pena de não ter concluído a criação do Fórum para a Sociedade Civil. Isso deixa-me alguma tristeza, mas o ‘timing’ assim não o permitiu.
A escolha dos candidatos não se fez sem polémica, nomeadamente no distrito do Porto. A dúvida era entre a escolha de Isabel Santos ou Manuel Pizarro para o 8.º lugar da lista… A questão nunca foi essa, porque o oitavo lugar seria sempre ocupado por uma mulher, tendo em conta a opção de intercalar os candidatos por género. Não houve polémica nenhuma, pelo menos entre mim e Manuel Pizarro. Houve, sim, pessoas que consideraram que o presidente da Federação Distrital do PS no Porto deveria ocupar outro lugar nesta lista. Contudo, os critérios de formulação da lista foram perfeitamente identificados desde início e não deixavam margem para dúvida. Além disso, entendo que o Manuel Pizarro está numa posição perfeitamente elegível. E essas reações foram sempre de fontes anónimas, por isso devemos desvalorizar…
Esta candidatura é para mim uma responsabilidade enorme, nomeadamente tendo em conta que irei representar a maior federação do Partido Socialista em Portugal.
Por outro lado, não lhe causa estranheza que o candidato da maior federação socialista do país só apareça no 8.º lugar da lista? Não, porque existiram critérios que assim o definiram. O que acontece é que somos a única federação que tem duas pessoas em lugares perfeitamente elegíveis, 8.º e 9.º. Creio que o Porto não foi desrespeitado neste processo, pelo contrário.
Que avaliação faz dos restantes membros da lista do PS às próximas eleições europeias? Tenho um grande respeito e admiração pelos restantes colegas que integram esta lista. Sinto-me perfeitamente confortável, porque me identifico bastante com as pessoas que a integram. Tive imensa sorte por poder integrar esta lista com estas pessoas.
Que mensagem espera passar aos portugueses nesta campanha eleitoral? Importa sublinhar um momento de grande desafio para a União Europeia. Devemos questionar-nos sobre o nosso papel na UE e de que forma podemos contribuir.
Não podemos esquecer o fenómeno da crise económica europeia, do movimento de refugiados, da ascensão de movimentos nacionalistas, o desafio da reforma do Euro… estamos num momento crucial da política externa. É um momento interessante em que importa estar.
No que diz respeito à campanha, importa, sobretudo, mobilizar as pessoas, sem esquecer uma abstenção acima dos 60% nas últimas eleições europeias, em 2014. É estranho quando o barómetro indica que os portugueses são maioritariamente pró-europeístas.
Esperamos uma discussão séria, centrada no futuro da Europa e sobre aquilo que importa fazer nos próximos anos. Infelizmente, não é a isso que temos assistido nos últimos dias e isso acaba por desmobilizar as pessoas, que estão mais interessadas em discutir assuntos sérios.
É preciso que percebamos a importância da UE no desenvolvimento do país, sobretudo nas próximas décadas. Precisamos que o nível da campanha suba e que se apresentem os projetos para que se comecem a debater ideias.
Neste momento, a União Europeia pode estar em causa? Este é um dos momentos mais decisivos para o projeto da União Europeia, sem dúvida! O avanço de movimentos nacionalistas e populistas têm colocado em causa o projeto europeu, que é um dos mais vanguardistas que conhecemos até hoje. A defesa da democracia e dos Estados de direito são extremamente importantes para o futuro da UE.
O que distingue esta lista do PS das restantes? No que diz respeito ao debate e troca de ideias, ainda não vi serem apresentados manifestos de candidatura, à exceção do nosso e do CDS-PP. Oiço muitos ‘soundbytes’, mas isso não conta, porque esvai-se no fim do dia.
O que importa aos portugueses é perceber o que podem fazer na União Europeia e o que podem receber dela. O PS tem ideias nesse sentido.
O modelo atual da UE ainda é adequado aos tempos que vivemos? Se está a referir-se à possibilidade de uma reforma no caminho do modelo federalista, creio que este não é o melhor momento para debater uma reforma da UE. Este é o momento de melhorarmos e aprofundarmos relações. Talvez mais tarde se avance para uma Europa federalista.
Contudo, neste momento, com o divisionismo que reina, não há condições para pensarmos nisso.
Como portuguesa, que sensação tem ao integrar uma lista ao Parlamento Europeu, tendo presente que Portugal chegou a ser classificado como um dos países que integrava os PIGS, designação pouco lisonjeira, atribuída pela Zona Euro após a crise económica que se abateu sobre o país? Quase todos reconhecemos hoje que esse processo devia ter sido gerido de outra maneira. Aliás, o processo de discussão do Orçamento italiano demonstrou isso mesmo, mais recentemente.
Há lições a tirar para o futuro, mas não podemos reescrever a história. Nesse sentido, julgo que temos um caminho a fazer, com novos passos.
Portugal é mesmo um bom exemplo no que toca à reestruturação financeira? Sim, é isso que vou ouvindo lá fora, até com uma certa estupefação. Somos encarados como um exemplo de um país que superou uma crise profunda. Ainda não podemos dizer que os problemas estão definitivamente resolvidos, mas a situação melhorou, apesar de tudo.
O facto de não ter surgido um espírito que levasse a movimentos extremistas em Portugal também é visto com bons olhos.
Que papel podem ter os portugueses na União Europeia e noutras instituições internacionais? Tem existido um sinal de reconhecimento da diplomacia portuguesa em vários cargos internacionais. Por outro lado, é também um reconhecimento de uma certa lealdade a princípios no panorama internacional. Julgo que os portugueses inspiram confiança e isso é um sinal positivo para todos nós. Devemos orgulhar-nos da nossa capacidade e da forma como nos temos afirmado em diferentes postos internacionais.
Portugal está preparado para o impacto do Brexit? Sim, Portugal estabeleceu acordos bilaterais com o Reino Unido e lançou, inclusive, uma campanha do Turismo de Portugal dedicada aos britânicos. Somos velhos aliados e penso que continuaremos a ser.
Contudo, julgo que é uma saída infeliz da União Europeia. Este processo tem causado um grande desgaste na sociedade britânica e deixará também uma marca na Europa. Todos perdemos. Portugal tem muitas empresas que dependem muito desse mercado e vai sofrer com isso, certamente.
A saída do Reino Unido vai deixar uma grande marca. Era um parceiro muito importante, sobretudo ao nível financeiro.
Acredita que Pedro Marques tem potencial para ser Comissário Europeu? Essa não é uma questão para este momento. O Parlamento ainda vai ser eleito, empossado, será eleito o presidente do Parlamento, depois o presidente da Comissão e só depois será feita a nomeação da Comissão. Não vale a pena especular sobre isso, embora reconheça ao Pedro Marques todas as qualidades para desempenhar esse cargo.
Rui Rio classificou a lista do PS como uma “lista de ex-ministros e ‘desempregados’ do PS”. Que leitura faz desta crítica? Não, ninguém estava no desemprego. Não percebo a crítica. Das pessoas que integram a lista não conheço ninguém que estivesse no desemprego, todos estavam em funções. É a tal falta de ideias para o futuro da Europa que leva a criarem-se ‘soundbytes’, mas a campanha política é muito mais do que isso.
Rui Rio ainda não encontrou uma ideia para a Europa, vai dizendo coisas sem sentido. Essa foi uma delas.
Há alguma missão que leve para o Parlamento Europeu? Pessoalmente não levo nenhuma missão particular, levo o Contrato Social do PS para a União Europeia. Acho que é a única missão coletiva que devo assumir neste momento.
É justo afirmar que Gondomar poderá ganhar uma embaixadora na União Europeia? Esta é uma candidatura europeia, só tem essa dimensão. Sou de Gondomar e resido aqui, por isso estou mais atenta à dimensão concelhia, mas esta candidatura está noutro patamar.
Haverá da minha parte um olhar atento sobre o distrito do Porto, isso posso garantir. É evidente que não sou insensível aos interesses de Gondomar.
É sempre importante para si regressar a Gondomar? Sem dúvida, não dispenso regressar a Gondomar ao fim de semana. Este é o meu porto de abrigo.